Vestes negras, impecavelmente vincadas, uma camisa branca engomada, laço preto, ataviado e feito a rigor.
Jantava solitário na esplanada, acompanhado de um bife do lombo, mal passado, com uma só pitada de sal, regado por um Don Perignon à temperatura ideal, verificada matematicamente pelo termómetro que trazia no bolso, vertido num flute cristalino.
De repente saída do nada, sublime e implacável, apareceu a Morte. Tocou-lhe levemente no ombro esquerdo e gelou-lhe o coração.
- Com que então Morte, vieste para me levar?
- Sim Crítico, chegou finalmente a tua vez.
- Bem podias ter chegado antes, tinha evitado pagar a conta.
- Sempre a criticar, sempre a criticar, pelo menos não deste a gorjeta.
- Qual gorjeta? replicou o Crítico Com a falta de qualidade deste serviço, ainda me deviam pagar por ter vindo aqui jantar. E se por acaso não tivesse morrido, amanhã fazia uma crítica a este restaurante que pelo menos durante um mês deixariam de ter clientes. Já agora Morte, não te importas que eu leve a factura? É para meter no IRS.
- Para onde vais não precisas desses papéis, não tens que te preocupar mais com coisas mundanas.
- Nunca se sabe, nunca se sabe. A propósito Morte, podias ter vindo ter mais arranjadinha.
- Como?!?
- Pois essas vestes andrajosas, já estão um pouco demodé, as cores também não são as deste ano. E essa foice, podias ter mais cuidado com ela, está a ficar nitidamente enferrujada e gasta. Muito pouco profissional Sra. Morte, nem parece teu.
A Morte serena e prepotente indicou-lhe o caminho. Foi ouvindo o seu companheiro de viagem, ele criticava o tempo, ele criticava o percurso, ele criticou a Morte, quando esta parou numa farmácia de serviço para comprar um par de Tampax, para enfiar sorrateiramente nos ouvidos.
- Por onde me levas, já estou farto de andar, se tivesses virado à esquerda, já lá estávamos.
Mesmo com os tampões, a Morte, estava nitidamente a perder a compostura, a voz do Crítico, conseguia perfurar qualquer protecção conhecida, e a célebre "paciência" da "Morte", estava rapidamente a esgotar-se.
Finalmente, já sem forças para ouvir o seu interlocutor, chegaram ao seu destino.
A morte bateu três vezes e passado um bom bocado veio um diabo, feio, encornado e corcunda abrir a porta. Não sem que antes o Crítico, viperino, não tivesse reclamado pela demora e pela falta da campainha.
- Boa noite, disse o diabrete, quem trazes aí ó Morte?
- Desculpa não percebi, deixa-me tirar os Tampax dos ouvidos disse a morte importaste de repetir a pergunta?
- Eu perguntava quem é que trazias?
- É o Crítico, posso ir-me embora, estou um bocado atrasada para outro encontro, e com a pressa esqueci-me de comprar aspirinas, estou mesmo a precisar delas.
- Já agora exclamou o Crítico porque é que não perguntam pela família, pelo canário, porque é que não
- Cala-te disseram a Morte e o diabo em uníssono.
- Já sabes Morte, procedimentos da casa, tenho que ir buscar o rol dos pecados desse senhor e tens que ficar até ao final da sentença.
- Vejam lá se ainda tenho que tirar a senha e ir eu à procura do meu processo
Os olhares furibundos que a Morte e o diabo lhe lançaram, foram suficientes para o Crítico, ficar calado durante uns minutos.
O diabrete, requebrado pelo peso do processo, ia caindo e espalhando no chão os volumes dos pecados do Crítico, após um esforço colossal lá conseguiu um espaço para os pousar.
- Morte, é melhor sentares-te um bocadinho, isto ainda vai demorar. E tu, Crítico não procures nenhuma cadeira, porque tens que ouvir aquilo que tenho para te dizer, em pé. Vamos então lá a começar: Primeira crítica, começaste logo pelo local, a hora, a data, o signo em que nasceste. Extraordinário. Já estava na massa do sangue. Depois com a hora da mamada, depois com o lado da mama. Coitada da senhora tua mãe
- Porquê é que a minha mãe é para aqui chamada? inquiriu o Crítico com as sobrancelhas arqueadas.
- Pois à tua custa, replicou o diabo, está no Purgatório.
- E então? Eu não vim para o Inferno.
- Pois, mas a tua mãe quando nasceste, lembraste, viu o monstro que estava em ti e tentou afogar-te?
- E depois?
- Depois, se não se tivesse arrependido, não tinha ido para o Purgatório, suspirou o diabo. Tinha ido directamente para o Céu
P.S.: Esta fábula é dedicada em exclusivo ao WOW. E como sabem, procedimentos da casa, existe livro de reclamações (É favor preencher os campos convenientemente para serem aceites)
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